Opinião: Ela Zul – Spine

Há algo poderoso em escolher o seu próprio nome. Micaela Martinez Saavedra, de nome artístico Ela Zul, encontrou o seu após ver um documentário sobre a artista performática Marina Abramović. O azul representa a vastidão do céu e do mar, e todas as sensações que isso nos traz, como a paz e a tranquilidade, mas também a solidão e a incerteza. Essa dualidade é explorada na música da artista peruana, especialmente no seu álbum mais recente, Spine, que usa filosofia e espiritualidade para guiar-se numa jornada em busca da autenticidade.

Género: Art Pop, Neoclassical, Latin Alternative
Data de Lançamento: 26/01/2024

 

Quando era mais nova, Ela Zul sonhava em ser escapologista, como Ehrich Weisz, de nome artístico Houdini. No entanto, foi na arte, e com ênfase na música e na pintura, que encontrou um meio para canalizar a sua teatralidade e expressar a sua constante necessidade de fuga. Essa temática de escapar, tanto física como emocional, é explorada de diferentes maneiras ao longo do álbum. Na faixa de abertura, ‘Lucha Andante’, o escapismo é visto através da lente de um relacionamento tóxico. Em ‘El Niño Espacial’, ele surge como uma resposta à negligência parental. Na faixa ‘Nada’, a fuga de si mesma é explorada por meio de versos como: “Eu queria que o mundo fosse plano para caminhar até cair.” Dentro da narrativa do álbum, todos esses cenários representam pedras no caminho para encontrar a própria identidade.

Spine tem um fio condutor melódico com notas expressivas de piano reminiscentes ao estilo de CocoRosie. A faixa instrumental ‘Mariola’ é um bom exemplo disso, com a sua progressão poética que evoca emoções sem a necessidade de dizer uma palavra. Para quebrar a quietude, faixas experimentais e arrojadas como ‘Virgen De Guadalupe’, ‘El Niño Espacial’ e ‘Sueño de un Genio’ trazem bastante dinamismo ao projecto. Esta última, produzida pelo também artista peruano Alonso Suarez Romero, oferece uma visão compassiva e amorosa sobre o mundo. Conceito semelhante é explorado na catártica ‘Noche de Algunas Lágrimas’, em que Ela Zul tenta convencer-se a si mesma de que tudo vai ficar bem com os versos “Noite de algumas lágrimas / Espero que reguem algo.”

Servindo como uma trilha sonora que ilustra a experiência humana da mulher que foi atraída para a terra no seu álbum anterior, World As A Magnet (2022), Spine usa a imaginação como mecanismo de resiliência. Uma trajectória complexa que integra a espinha dorsal no seu título como metáfora para o peso que é preciso suportar em todos os nossos momentos de metamorfose. Um lembrete de que, por mais dura que seja a jornada, não somos assim tão fáceis de quebrar. Se fomos atraídos para a terra, por algum motivo será.

 

Faixas favoritas: ‘Soñé’, ‘Nada’, ‘Mariola’

 

Ruben António

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