Opinião: As diferentes lutas pela igualdade!

Mais um dia da mulher! Continuamos a viver em pandemia e continuamos, especialmente hoje, a tomar nota das promoções incríveis de moda e beleza, piadas típicas sobre cabelos, mini-saias, loiras e morenas e cervejas que não chegam à sala sozinhas. Haja paciência irmãs/irmãos. Deixo uma breve nota: há demasiados discursos feministas inflamados e, atualmente, sinto um certo movimento crescente de quem acredita que o feminismo é o contrário de machismo. Talvez volte a este assunto antes do próximo ‘Dia Internacional da Mulher.’

Gordon Johnson , Pixabay

Hoje, escrevo do alto do meu estatuto de mulher, com privilégios, que sente a necessidade de chamar a atenção para a situação de outras mulheres que lutam pela igualdade, mas num patamar bastante diferente do meu, do nosso.

Não retiro a importância da luta pela igualdade salarial, pelas iguais oportunidades de acesso e de sucesso entre homens e mulheres, mas, permitam-me tocar em alguns assuntos que nos têm passado ligeiramente ao lado.

https://civicspacewatch.eu/

A 27 de janeiro de 2021, a Polónia deu passos de gigante, mas no sentido inverso, no que diz respeito aos direitos reprodutivos das mulheres e, revoga os Direitos fundamentais na UE, Carta. A Polónia, um país maioritariamente católico, proíbe a interrupção voluntária da gravidez, o aborto, e apenas o permite em casos de violação, incesto e perigo de vida da mãe. Nem a mal formação do feto escapa à lei polaca. Entre as considerações da União Europeia ao tema1,destaco o seguinte: em 2018, apenas 10% dos hospitais contratados pelo fundo nacional de saúde da Polónia possibilitavam abortos legais”. Com isto, facilmente adivinhamos o elevado número de mulheres que colocam as suas vidas em risco ao realizar abortos de forma ilegal, sem condições de segurança. Isto acontece na Polónia! A Polónia, na Europa, na União Europeia. Aqui ao lado!

E neste jardim à beira mar plantado, estará tudo a correr bem na promoção dos direitos básicos das mulheres?

Revista Frontal

Desde 2015 que, em Portugal, a Mutilação Genital Feminina é considerada crime. Os casos acumulam-se às centenas, ano após ano, mas até 2021, segundo o Observador, o Ministério Público apenas abriu 11 inquéritos: 8 arquivados, 2 em investigação e 1, pela primeira vez, resultou na condenação da mãe que sujeitou a sua bebé de um ano e meio a esta prática bárbara com origem em rituais tradicionais.

Deixem-me explicar, de forma dura e sucinta, o que é a mutilação genital feminina. Trata-se de uma prática normal e frequente em cerca de 28 países Africanos, no Iémen, Omã, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Indonésia e Malásia que promovem verdadeiros atentados à dignidade humana, provocando atos bárbaros contra mulheres, ao considerarem a sua sexualidade repugnante e merecedora dos mais ferozes ataques à vida humana, legitimados à luz das diferenças culturais, religiosas ou de práticas ancestrais. A MGF consiste em “todas as intervenções que envolvem a remoção parcial ou total dos órgãos genitais femininos externos ou que provoquem lesões nos órgãos genitais femininos por razões não médicas.” O relatório da OMS (2000) considerava Portugal um lugar de risco no que diz respeito a estas práticas devido à população imigrante oriunda, essencialmente, das comunidades Africanas e da proliferação das comunidades muçulmanas por toda a Europa.

A verdade é que este atentado à mulher é uma prática com séculos e, muitas mulheres, consideram-no normal.

Fonte: visão noticias.com/Brasil

Em 2021 condenamos a primeira mulher, mãe, com 20 anos de idade, mutilada em criança, por ter permitido que a sua filha também o fosse. Sem qualquer tentativa de desculpabilização, mas sim de reflexão sobre a forma como educamos as mulheres e homens, faço minhas as palavras do seu advogado citado pelo jornal Observador:

“ Vamos pegar numa jovem de 20 anos e mandar para a cadeia? (…) Só para mostrar ao mundo, a Portugal, que agora há uma decisão que põe fim a essas práticas (…)?

A questão é pertinente e alvo de pouca discussão. É importante reforçar que isto de facto acontece em Portugal, contrariamente ao que possa parecer, perante a forma como cai no “ esquecimento”.

Para terminar, antes de vos deixar boas sugestões de leitura e choque de realidade, há uma outra situação que envolve mulheres, direitos e Portugal que, neste dia da mulher e em todos os outros, merece destaque: o Tráfico de seres humanos.

De acordo com o relatório das Nações Unidas e de dados atualizados a julho de 2019, as mulheres constituem mais de 80% dos casos reportados de vítimas de tráfico e 85% desses casos destinam-se à exploração sexual.

Segundo apurou a revista Sábado 2, Portugal é o 2º país da União Europeia com maior número de casos de tráfico de seres humanos, confirmando a tendência de serem as as mulheres as principais vítimas, e de terem como destino mais provável a exploração sexual.

O Dia Internacional da Mulher tem vários significados, representa várias lutas, consoante os direitos que temos vindo a conquistar. Por todas as mulheres que constam nestas estatísticas, pelas mulheres que vivem na Polónia, pelas mulheres das comunidades africanas e muçulmanas a viver em Portugal, pelas mulheres exploradas sexualmente, é nosso dever ajudar na sua luta por direitos que, olhando do alto do meu conforto, considero serem absolutamente elementares. A sua luta é a Nossa Luta, porque direitos conquistados serão mais facilmente revogados se deixarmos de lutar por eles. Que a luta seja feita por ti também.

 

Sugestões de leitura

 

Mutilada – O testemunho de uma criança que, aos sete anos, viveu este pesadelo. É a história e o percurso arrepiante de uma sobrevivente. Uma militante que luta sem descanso para salvar as crianças do horror que ela própria viveu. Tornou-se representante da Rede Europeia da Luta Contra a Mutilação Genital Feminina.

 

 

 

Vendidas – A história de duas irmãs que, por trezentos e cinquenta contos (1525€) foram vendidas e obrigadas a casar à forma no Iémen. Um relato doloroso do que é ser filha e mulher no outro lado do mundo.

 

 

 

 

A Prisioneira de Teerão – A história de Marina, uma jovem católica que foi presa, torturada e condenada à prisão perpetua por cometer dois crimes : envolver-se com um homem e ousar opinar. Mais uma história do que as mulheres vivem, do outro lado do mundo.

 

 

Marília Azevedo

 

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