Os Grammys 2021: desenferrujando o gramofone dourado

Seriam necessárias milhares de pessoas para sermos capazes de contar pelos dedos o número de eventos que foram adiados por causa de um agravamento da pandemia. Os Grammys não foram exceção e se tudo tivesse corrido como planeado teriam decorrido no último dia de janeiro deste ano. No entanto, mesmo que se tivesse mantido a data prevista, o evento teria igualmente de se adaptar a esta (infelizmente) não tão nova realidade de videochamadas e distanciamento social.

A questão da mudança de formato apresentava-se como um verdadeiro problema de identidade para os Grammys. Mais do que um evento em que as estatuetas em forma de gramofone passam da academia para as mãos dos vencedores, os Grammys são um espetáculo em si mesmo: uma reunião altamente mediatizada em que velhas estrelas e novos talentos de vários géneros musicais se encontram numa única noite.

Sendo conhecidos por serem mais um barómetro de popularidade do que de qualidade musical, as atuações e a passadeira vermelha são os principais focos de atração dos espectadores. Com uma lista de convidados reduzida, sem público ao vivo e tendo de cumprir o distanciamento social colocava-se a questão de como poderiam continuar relevantes.

Nomeados

Como é habitual, a categoria de Álbum do Ano foi dominada pela música pop. Apesar disso, nesta edição a concorrência foi um pouco mais variada, passando por sonoridades  r&b e soul (Chilombo de Jhené Aiko e o álbum homónimo dos  Black Pumas) pelo hip pop ( Hollywood’s Bleeding de Post Malone) ou o pop rock (Women In Music Pt. III das Haim).

Apesar da competição, este prémio parecia destinado a ser entregue a um destes dois álbuns: Folklore de Taylor Swift, que representa uma nova direção musical na carreira da cantora ou  Future Nostalgia de Dua Lipa, que no ano em que todas discotecas estiveram fechadas trouxe a pista de dança até casa com músicas como Don’t start now que estava nomeada e era favorita para Música do Ano

Taylor Swift, Post Malone e os Black Pumas também contavam com nomeações para Músisca do Ano ou Gravação do Ano e nas duas categorias enfrentavam a competição de Everything I Wanted de  Billie Eilish, a grande vencedora da edição do ano passado.

Como foi referido anteriormente, os Grammys são frequentemente criticados por procurarem agradar ao público e serem uma repetição dos tops musicais do ano. Contudo, nem esta fórmula é capaz explicar algumas omissões nas nomeações deste ano. The Weeknd, cujo hit Blinding Lights foi o primeiro a passar 52 semanas no top 10 da Billboard’s Hot 100, não recebeu nenhumas nomeações, nem nas categorias gerais nem nas categorias pop.

Infelizmente, o Grammys têm a merecida reputação de sistematicamente deixarem de fora artistas não-brancos das categorias principais. O exemplo mais gritante desta situação é Beyoncé, que embora lidere com o maior número de nomeações este ano (com Black Parade nomeada tanto para Gravação do Ano como Música do Ano), em edições anteriores, apenas obteve uma vitória nas categorias gerais.

No entanto, em termos de inclusividade houve um motivo para celebrar. O grupo de K-pop BTS recebeu uma nomeação para Melhor Performance Pop de Grupo e foram o  primeiro grupo de K-pop a atuar e interpretar uma música original nos Grammys.

Na categoria de Artista Revelação a dúvida parecia estar entre Phoebe Bridgers, a cantora indie-rock que acumulava quatro nomeações e Megan Thee Stallion, a rapper também nomeada para Melhor Gravação do Ano com Savage.

Cerimónia

A cerimónia decorreu como de costume em Los Angeles mas desta vez no exterior do Staples Center. Os nomeados sentaram-se em mesas afastadas para cumprir o distanciamento social e as atuações tiveram lugar noutro local sem público ou ocorreram de forma remota. O apresentador Trevor Noah teve responsabilidade de fazer as transições entre os diversos locais e formatos e não falhou neste papel.

Quanto às atuações, esta cerimónia alternativa parece até, de certo modo, ter beneficiado os Grammys. Em vez de atuações com uma quantidade exorbitante de luzes e bailarinos, as performances ganharam um cunho mais intimista. Esta nova atmosfera fez-se sentir logo no momento da abertura em que Harry Styles, Billie Eilish e as Haim (em palcos devidamente distanciados) interpretaram cada um as suas músicas.

Estes estilo serviu ainda para acentuar os momentos mais emocionais da noite como quando Mickey Guton, a primeira mulher afro-americana a ser nomeada para o Grammy de Melhor Performance Country, a interpretou o seu tema de Black Like Me ou as homenagens a todas as pessoas do mundo musical que morreram no ano de 2020, que incluiu a atuação de Lionel Richie em honra de Kenny Rogers.

No entanto, a interpretação de The Big Picture por Lil Baby foi, sem dúvida, o momento que atraiu mais os olhares dos espectadores. Numa apresentação de cariz cinematográfico, o rapper deu vida aos versos da canção (nomeada para Melhor Música Rap do Ano), que fala sobre a discriminação racial e violência policial nos EUA, contando para isso com a participação da ativista Tamika Mallory.

A cerimónia decorreu, como habitualmente, intercalando atuações dos vários artistas nomeados com entregas de prémios, alguns dos quais foram anunciados remotamente por trabalhadores de icónicos estabelecimentos de música ao vivo. O objetivo desta iniciativa foi chamar a atenção para as dificuldades que o sector musical enfrenta durante a pandemia.

Resultados

Em resumo, este ano fica marcado por uma distribuição diplomática dos prémios pelos diferentes artistas, com nenhum dos nomeados a arrecadar todas as categorias principais como aconteceu com Billie Eilish no ano passado.

A cantora de 19 anos desta vez levou apenas o troféu de Melhor Gravação do Ano, escolha que surpreendeu o público e a própria artista. O prémio de Música do Ano que, ao contrário do anterior é entregue apenas aos escritores da canção e não aos produtores, foi atribuído a I Can’t Breathe da H.E.R, cujo titulo cita as palavras de George Floyde, o afro-americano que morreu vitima de violência policial em Maio de 2020.

Apesar de não ter arrecadado nenhum destes dois Grammys, depois de vencer Melhor Performance de R&B e Melhor Música Rap em conjunto com Megan Thee Stallion, Beyoncé tornou-se a primeira mulher e a segunda pessoa mais premiada pelos Grammys acumulando 28 vitórias.

E não foi a única a fazer história nesta edição: Taylor Swift ganhou o Álbum do ano com Folklore tornando-se a primeira mulher a conquistar este prémio por três vezes.  E para não deixar dúvidas de que a noite dos Grammys se escreveu no feminino, Megan Thee Stallion além de ser a primeira mulher a vencer o Grammy de Melhor Música Rap também levou para casa a prémio de Artista revelação do Ano, garantindo que as quatro categorias principais foram atribuídas a artistas femininas.

Neste artigo tentamos abordar apenas as categorias gerais dos Grammys. Para veres os nomeados e vencedores em todas 84 categorias clica aqui.

 

Mariana Gil

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